Nossa Senhora da Porta, escudo contra os hereges
Com a invocação abaixo, a Virgem Santíssima é venerada em Otuzco, ao norte do Peru. Tal devoção pouco conhecida no Brasil, baseia-se num estupendo milagre e contém uma lição: é impossível que Nossa Senhora não vença todos os impossíveis.
Valdis Grinsteins
Com essa invocação, a Virgem Santíssima é venerada em Otuzco, ao norte do Peru. Tal devoção, pouco conhecida no Brasil, baseia-se num estupendo milagre e contém uma lição: é impossível que Nossa Senhora não vença todos os impossíveis |
O século XVII foi o século de ouro do Vice-reinado do Peru. Nessa época, brilharam as melhores qualidades do povo peruano, bem definidas pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira como “grandeza, senhorio e santidade”. A fama de suas riquezas era tal que até hoje se usa na Europa a frase “vale um Peru”, para indicar algo de muito valor.
Mas foi precisamente essa riqueza que fez despertar a cobiça de piratas protestantes, os quais não eram -- como os apresentam os filme de Hollywood -- aventureiros elegantes e audazes. Eram, isto sim, verdadeiros terroristas da época, que chegavam repentinamente em poderosas frotas, movidos por seu ódio sectário e punham-se a roubar, violar, queimar e destruir as imagens existentes nas igrejas católicas.
Santa Rosa de Lima, a grande santa peruana, é representada sempre com uma âncora aos pés, pois conseguiu com suas orações e mortificações afastar da cidade de Lima a frota do pirata e herege holandês Spilberg. Este fato é sintomático para atestar a proteção divina concedida pela intercessão da Virgem Santíssima à capital peruana.
Nossa Senhora, escudo contra os terroristas da época
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A história da Virgem da Porta começa com um caso de pirataria, na cidade de Trujillo, ao norte do país. No ano de 1674, apareceu na praia de Huanchaco uma frota pirata que já havia cometido crimes na cidade de Guayaquil, no Equador, e na vila peruana de Zaña, então importante centro urbano, onde falecera São Toríbio de Mogrovejo, Arcebispo de Lima.
Os habitantes de Trujillo ficaram evidentemente atemorizados com o advento dessa frota e enviaram emissários a todas as cidades e vilas da região, entre elas Otuzco, que se encontra nas montanhas a apenas 70 quilômetros de Trujillo.
Os moradores dessa localidade ficaram também muito preocupados. E, não dispondo de muralhas nem contando com qualquer possibilidade de defesa, decidiram recorrer Àquela que é, segundo a Sagrada Escritura, “terrível como um exército em ordem de batalha”. Assim, como recurso extremo, colocaram na porta da cidade uma imagem de Nossa Senhora da Conceição.
Havia em Otuzco uma ermida dedicada à Virgem da Conceição, graças à devoção de uma ilustre dama, Dona Florência Mora de Sandoval, célebre pelos inumeráveis atos de caridade que praticou.
Curiosamente não foi essa a imagem, Padroeira da cidade, a que foi colocada na porta, pois um costume do Vice-reinado exigia que ela saísse de seu altar na Igreja somente para a procissão, no dia de sua festa. Muito respeitosos dos costumes vigentes, os habitantes de Otuzco não quiseram retirar a Padroeira de seu lugar, mesmo por ocasião daquela calamidade.
Assim, ficou defendendo a porta da cidade outra imagem de Nossa Senhora da Conceição, trazida da Venezuela anos antes, para a realização de procissões da Imaculada em outros dias que não o da festa oficial. Tal imagem tem um metro de altura e está colocada sobre uma rocha de 25 cm de altura toda forrada de prata.
Após colocá-la precisamente no local onde, a qualquer momento, se esperava o advento dos hereges, a população estava compenetrada de que só lhe restava rezar e confiar na proteção maternal de Maria Santíssima. Três dias e três noites permaneceram os habitantes orando juntos à porta da cidade, aos pés da imagem, aguardando o temível ataque.
Mas... o impossível aconteceu! Os protestantes holandeses, cuja superioridade numérica e de força era evidente, nem desembarcaram! Até hoje nenhum historiador conseguiu apresentar uma explicação natural convincente para o fato: as cidades de Trujillo, Huanchaco e Otuzco foram preservadas de qualquer ataque dos terríveis piratas.
Duas Padroeiras da mesma cidade
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A imagem da Virgem da Porta sai em procissão todo dia 15 de dezembro. Ao fundo, o majestoso santuário |
Ao receber a notícia de que as velas dos barcos piratas haviam desaparecido no horizonte, a alegria dos habitantes de Otuzco foi enorme, conduziram então a imagem da Virgem em procissão até o interior da cidade, em meio ao maior júbilo. Mas, não querendo que, após o grande favor recebido, ela ficasse em posição “desvantajosa” em relação à Padroeira, decidiram os moradores construir-lhe um santuário bem na porta da cidade, no local em que os havia defendido.
Nasceu assim a devoção à Virgem “da Porta”, que é hoje a devoção a Nossa Senhora mais difundida no norte do Peru. Todas as numerosas e belas igrejas coloniais de Trujillo possuem uma réplica dessa imagem próxima à porta de entrada. Igualmente nas igrejas dos outros povoados dessa região observa-se sempre uma cópia desta imagem junto à entrada.
As procissões de agradecimento pela fuga dos piratas, se estendem até nossos dias, reunindo milhares de peregrinos, infelizmente nem sempre com a mesma piedade dos primeiros devotos.
A fama da imagem na região é tal que, por ocasião do Congresso Eucarístico Nacional em Trujillo, em 1943, foi ela escolhida para ser coroada canonicamente, como fecho daquela celebração. Tal coroação ocorreu a 27 de outubro de 1943.
Milagre do Anel: desvelo materno
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Dentre outros fatos admiráveis realizados por mediação da Virgem da Porta, o mais conhecido é o milagre do anel.
Certo dia, próximo ao início da novena de sua festa, chegou a pé, proveniente de um povoado denominado Chimur, perdido nas montanhas vizinhas, uma devota muito pobre.Desejava mandar celebrar uma Santa Missa durante a novena, por uma intenção particular muito premente. Como não possuía dinheiro para encomendar a Missa, pediu esmolas por toda a cidade até obter a quantia suficiente. Satisfeita com o resultado, solicitou ao pároco local -- um sacerdote de sobrenome Landa -- a celebração da Missa.
Porém, satisfazer à última hora esse desejo por ocasião da festa da Padroeira, era impossível, devido às numerosas solicitações para a celebração de Missas. Desconsolada, a pobre mulher renovou o pedido, que não pôde ser atendido pelo sacerdote. Começou, então, novamente a pé, sua viagem de regresso a seu vilarejo.
A realização de outro “impossível”
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Na metade do caminho, encontra-se a desconsolada mulher com uma jovem senhora, de porte majestoso. Pareceu-lhe estranho tão digna pessoa estar caminhando por aquelas pobres localidades. Tal senhora lhe entregou um precioso anel, aconselhando-a a voltar imediatamente a Otuzco e renovar ao padre o pedido da Missa, mas sem referir-se a esse inesperado encontro. A devota seguiu a recomendação e retornou, sempre a pé, à casa paroquial.
Pode-se imaginar a surpresa do sacerdote ao reencontrar aquela humilde mulher que insistia na celebração do Santo Sacrifício, mostrando-lhe a jóia que ele conhecia perfeitamente: o valiosíssimo anel usado pela imagem da Virgem da Porta no altar onde é venerada. Ninguém havia notado o desaparecimento dele. E não seria possível à pobre mulher apoderar-se dessa jóia naqueles dias, em meio à multidão de fiéis. Ante a demonstração de tal predileção da Mãe de Deus àquela fiel devota, o sacerdote imediatamente concordou em celebrar a Missa.
Nos conturbados dias em que vivemos, diante de tantos problemas insolúveis e dificuldades insuperáveis, quer do ponto de vista espiritual como material, tenhamos presente essa devoção mariana. Ela constitui um possante estímulo para confiarmos na proteção de Nossa Senhora, por mais insuperáveis que pareçam as dificuldades que nos afligem.
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Nota:
Agradecemos a valiosa colaboração, para a publicação deste artigo, do Sr. Pároco de Otuzco, Pe.William Rodriguez Tello, bem como das irmãs da Confraria da Virgem, Sras. Ana María Mondoñedo de Alvarado e Melva Bocanegra de Lynch.
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